Eu era jovem mas eu me lembro com clareza: meu exato primeiro dia de faculdade na ESPM teve uma a aula inaugural ministrada pelo diretor da faculdade de publicidade dizendo que os padrões de consumo estavam mudando. E é um tanto irônico que, de 1998 para cá, o discurso de tudo está mudando vem sendo repetido à exaustão, tanto que parece ter se tornado um grande clichê. Tão grande que até eu estou me repetindo, de tantas revoluções que eu presenciei na minha vida bem vivida.
Deixa-nos com a certeza que a única constante é a mudança, um pensamento de Heráclito de Éfeso, filósofo grego nascido em 540 antes da Era Comum. Se ele visse o que aconteceu com o mundo nos 2000 anos sequentes, teria esmurrado a mesa e soltado um sonoro “não disse? Eu bem que eu disse!”
E ele disse e era verdade. Mas o tempo passava mais devagar no tempo dele. No meu, o bicho está pegando.
Estou levantando essa bola insipirado pelo post do meu amigo Rafael Rez que enviou o seguinte alerta de que o poder do jovem nos mercados tem diminuído. (vale a pena ler esse artigo, que é curto, claro e traz um quentinho no coração para quem já não tem joelhos confiáveis nem baldes de colágeno).
E ele traz uma observação interessante sobre o que é o Brasil hoje, em termos de idade de composição da população:
Não somos mais um país jovem. Não somos mais o país do futuro. Quando eu percebi que era gente, o gráfico acima, chamado Pirâmide Etária era efetivamente uma pirâmide.
Era, efetivamente, assim:
Na base, milhões de nascimentos que vão sendo ceifados pelas condições precárias que a ditadura militar nos deixou de herança na saúde pública, alimentação, má distribuição de renda, industrialização, etc.
Convivi ainda criança com escandalosas notícias de fome, doença, pobreza e mortandade. Atingir uma saudável velhice no Brasil dos anos 80 era algo muito raro.
Custou-nos 40 anos e muita briga política, mas graças a universalização da saúde, políticas de prevenção e valorização da vida e desenvolvimento urbano e tecnológico, hoje conseguimos dar aos bebês do Brasil uma vida plena, como se pode ver no gráfico de 2022, três anos atrás.
Vamos destacar a lição do dia: nunca, nunca, nunca em hipótese alguma, permita ao exército administrar porra nenhuma.
Aliás, vamos destacar mesmo:
Nunca, nunca, nunca em hipótese alguma, permita ao exército administrar porra nenhuma. (Tazzo, Felipe)
De volta ao propósito inicial desta conversa, que é o artigo do prof. Rafael, ele elenca ali alguns outros fatores de comportamento da população que pesam no padrão de consumo: a população chega com mais idade e mais saúde e mais disposição de viver, mesmo se aposentando um pouco mais tarde do que em 1980 (obrigado, FHC!). Também pesa o fato que o brasileiro tem tido cada vez menos filhos (porque a gente é um bando de chato, ranheta e pessimista). E mesmo com criancinhas saudáveis e rechonchudinhas, um robusto SUS e condições econômicas muito boas, a população brasileira cresce cada vez menos.
A população em 2020 cresceu apenas 0,4% e logo, logo, começa a encolher, mesmo com população migrante (haitianos, sírios e venezuelanos inclusos).
Daí é que o jovem hoje, adolescente e pós adolescente tem muito menos poder nas decisões do dia a dia de uma família do que tinha na década de 90 e até nos anos 2.000. E a gente nunca esteve preparado para lidar com a adultice no Brasil. Muito menos com a terceira idade. Do ponto de vista mercadológico, Rafael argumenta acertadamente, os produtos não estão preparados para atender essa faixa de população.
Aqui em casa essa deficiência já apareceu: meu celular hoje em dia só funciona com um acessório extra não fornecedio pela samsung nem pela apple: óculos. Quem é que enxerga essas letrinhas miudinhas? Assistir TV, com o celular ao lado como fazem os xóvens é pior ainda: requer o óculos de ver de perto e o óculos de ver de longe!
(e eu não vou aderir aos bifocais; depois disso só mesmo com aquela cordinha de amarrar no pescoço)
E depois dessa longa análise demográfica e sociológica, e o Quico?
(não conhece essa? é porque você não usa bifocais)
O Quico tenho a ver com isso?
Eu tenho o livro.
Bom, o livro sempre foi um problema: todo mundo anda dizendo que tem que estimular o jovem na leitura, para se tornar uma pessoa melhor. E daí que no terceiro ano do ensino médio (antigo colegial) todo mundo tem que ler Memórias Póstumas de Brás Cubas, A Pata da Gazela, Amor de Perdição, O Guarani e um monte de outros clássicos em linguagem arcaica e fazer o fichamento desses livros porque cai na prova.
Meu Deus Inexistente, tem jeito melhor de fazer um adolescente odiar alguma coisa do que obrigá-lo/a a fazer? É mais agradável convencê-los a tomar óleo de fígado de bacalhau!
O adolescente é um idiota (falo com propriedade -até já fui um). O máximo de esforço que a deveríamos estar fazendo é convencê-los a usar camisinha e pegar leve nas dorgas. Hábito de leitura se cria no hábito, no dia a dia, começando aos poucos, de leve e de acordo com a necessidade e possibilidade.
É claro que adolescente lêem. Lêem e muito, se comparadas às demais faixas etárias, e em especial as meninas. É por isso que o mercado literária se orgniza tão finamente de acordo com as idades, separando livros infantis de livros mid grade (ali pela pré adolescência) e dos YA (young adult -que era para ser jovem adulto, mas abrange a adolescência).
Mas enxovalhar José de Alencar na mão dessa pirralhada que não para quieta e tem impulsos emocioniais descontrolados é meio que pedir demais do ser humano. Deixa ler Harry Potter e guarde os clássicos para lá.
E se você já está pensando que velho vai ler livros de velho, com linguagem antiga, isso é porque você é parte dos chatos, ranhetas e pessmistas. Dá uma sapecada nesse, nesse, e nesse artigo (já vai calculando aí como vai ser minha aposentadoria).
Já eu, me sinto livre. Vou escrever livros com fontes grandes, agrade a quem agradar, doe a quem doar (no meu pix!).
Bêjo!
Ah, eu fiz outra palestra muuuuuuuito legal sobre o uso da IA na escrita criativa. Teve ate matemática no meio. Obrigado SESI da Vila Leopoldina. Tá sendo muito chique!
Você nunca passa frio pois está sempre coberto de razão.