Estou ficando velho e, como nenhum outro velho, estou ficando menos paciente e menos complacente com as coisas da vida. Antes eu até fazia média. Hoje em dia eu toco o terror. Eu não fui um adolescente bem comportado, mas me lembro claramente de aprender que seguir as modas e as regras nunca foi algo saudável para mim. E hoje, do alto das minhas barbas brancas, estou ainda mais questionador. Mais desafiador das coisas da vida.
Talvez eu me comporte, mas ao menos eu quero saber o por quê das coisas. Vou me comportar por que? Para que me serve essa regra?
Eu posso até aceitar as coisas como elas são. Mas eu vou fazer isso reclamando, xingando e me revoltando de todos os jeitos. E quer saber, essa é uma das minha melhores e mais criativas qualidades (cara, eu não passaria em entrevista de emprego nenhuma!)
Mas, sim, questionar é o primeiro passo da criatividade. E eu ganhei mais sendo criativo do que bom moço.
Mas a propósito de bom mocismo, vamos discutir ética e moral? Vai ser rapidão, fica sussa.
Eu tenho um entendimento específico de ética e moral. Por específico eu quero dizer simplório mesmo, tá? Sem frescura e nem floreio. E esse entendimento vem da criação de personagens de jogos de RPG, para desespero de todo professor de filosofia, sociologia e quejandos. Mas funciona para o meu propósito de organizar o pensamento.
Senão, vejamos:
Moral: A moral é estabelecida para orientar o comportamento humano e alcançar uma boa convivência social. Ela delimita a liberdade individual com a responsabilidade.
A moral é uma orientação de liberdade e responsabilidade que nos faz conviver os outros dentro desse contexto que é a nossa sociedade na nossa época atual. E para graduar a existência dessa moral, inventou-se o “bom” (maior identificação com a moral vigente) e o “mau” (negação da moral vigente, ou seja, foda-se a convivência com os outros). Não é de graça que os heróis são bons (morais) e os vilões das histórias são imorais.
Ética: Conjunto de regras ou leis que estabelecem o funcionamento de agrupamentos de interesse.
Quase a mesma coisa que moral, porém restrita a um grupo específico, por exemplo religiões, esportes, grupos sociais, etc. Dentro do exército, além da lei brasileira, existe um conjunto de regras rígidas que todos devem obedecer. Por exemplo a hierarquia. O cabo deve bater continência para o sargento e o sargento para o tenente. Isso é a ética deles. Dentro do grupo dos skatistas existe regras não ditas e não escritas que devem ser seguidas, a começar pela identificação com o grupo. Tem roupa certa para usar. Tem jeito certo de falar. Músicas corretas para escutar. Dentro dos roqueiros também. Se você já foi a um show de metal, vai sofrer para encontrar uma roupa que não seja preta. Roupa preta é ético. Rosa é antiético.
Advogados tem lá seu comportamento, regiões periféricas da cidade tem suas regras, tenistas observam certos hábitos, etc. Tudo comportamento ético. E, é claro, estar dentro da ética não significa necessariamente ser correto ou moralmente bom. Significa dançar conforme a música, sim ou não.
Bandidos tem lá sua ética. Aliás, em algum lugar eu li uma declaração de um bandido que eles não matavam ninguém. Só faziam os furos. Quem mata é Deus. Tá aí o jeito de pensar desse… setor da sociedade.
E se você combinar as coisas, vai ver que existe mais ética (mais afeita às regras) e outras menos. Essas mesmas pessoas podem ser mais morais ou menos morais. Mas espera, como assim?? Como é possível ser bom e antiético?
Bem vindo ao quadro de alinhamento de caráter. Ou seja, tabela de ética versus moral:
A tabela se desloca da esquerda para a direita (as colunas) de acordo com a competência ética. Na esquerda as personagens mais afeitas às regras, leis, procedimentos. Por exemplo o Super Homem. Na outra ponta, alguém que odeia as leis com todas as forças ou o Robin Hood que roubava mesmo. Na caruda. E assumia. Era um ladrão. Mas era bonzinho. Mas era um ladrão. E o antônimo de legalista aqui é “caótico". Ou seja, o caos é a subversão da ética. Da rigidez dos pensamentos, do seguir procedimentos. Da obediência.
E as linhas da tabela seguem o que conhecemos como moral. Embaixo ficam os vilões, os maus. E na linha de cima os heróis. Então o Darth Vader é um vilão, certo? Mas ele segue as leis? Sim! O universo Star Wars tinha até um Senado (corrupto e manipulável). E o grande objetivo de Vader era esmagar a rebelião (os caóticos e antiéticos) e trazer “ordem para a galáxia".
Darth era um legalista. Pro mal. Viu como dá para seguir a lei certinho e ser um baita de um cuzão? Bom, eu sou o oposto disso. Quer ver onde eu me idetifico?
Não é que eu não gosto das regras… É, eu odeio regras. Odeio que me digam que as coisas são assim mesmo e que sempre fizemos assim. Sempre foi desse jeito. Eu quero, no mínimo do mínimo, saber por que essa regra deve ser seguida. Por que “por que” de pergunta é separado? Mas é. Gramática. E “porque” de resposta é tudo junto e “por quê” é objetificado. É o “por quê” das coisas. Separado e acentuado.
Tá vendo, eu aprendi as regras. Só ainda não sei o por quê.
Já a concordância verbal (por exemplo, as flores são amarelas) é porque o português é uma l;ingua empolada redundante e metida a besta. Se eu escrever "as flor é amarela", o significado é o mesmo. Tá um pouquinho mais feio e fora do português padrão normatizado. Mas explica o que eu preciso saber.
Tá vendo? Eu questiono tudo. Inclusive o que eu devo e não devo questionar e por que estou questionando. E eu tenho aprendido muito com isso. Não gasto muito tempo ensinando. Mas gasto bastante tempo sendo criativo e escrevendo e isso exige eu saber as coisas. E também os por quês das coisas (separado e acentuado).
Conhecer as regras é fundamental para entortá-las para lá e para cá sem correr o risco de ser preso.
Jogar umas regras fora faz um bem, você nem imagina!
Gostou dessa? Passe adiante!
Hoje foi curtinha porque estou apurado das coisas aqui. Semana que vem vai ser mais tranquilo, escrevo mais. Prometo.
Bêjo
Tem 4 filmes de tiro, porrada e bomba na Netflix. São bons? Não, de jeito nenhum. Só tem tiro e mais nada, mas a parte mais interessante é que todo o universo ao redor de John Wick é brutalmente legalista. Em 4 filmes ele mata 439 pessoas (alguém contou!) por obediência cega à ética dos assassinos. Ele quebra essa ética uma ou duas vezes e se fode grandão quando faz isso. Nem sempre é bom ser ético.
Belle Sisoski é uma produtora, DJ, multi instrumentista, cantora e compositora malaia que mistura instrumentos do sudoeste da ásia com música eletrônica. Sonzão para quem curte uns barulhinhos eletrônicos! Tá lá no Spotify.
Shiko é um artista espetacular de João Pessoa que faz graffiti, design e quadrinhos (que eu saiba, deve ter mais coisa por aí). Essa série dele é assustadora de boa. A capa diz tudo, né? Histórias do cangaço, minha gente, um tenebroso capítulo da história do Brasil que teima não sumir.