Quando eu era criança lá em Barbacena (mentira eu nem sei onde fica Barbacena; essa piada é do show do Chico Anísio) eu acreditava, como todo jovem e nubente artista, o que eu fizesse, as pessoas comprariam avidamente. Culpa da nossa capacidade de absorver a histórias dos vencedores e não conhecer todas as histórisa dos que ficaram pelo caminho.
Em qualquer site de notícias (assim como em qualquer revista ou jornal, lá na era de antanhos — também não sei quem era esse antanhos!) notícias de pessoas vencendo, crescendo, sendo escolhidas, etc, nos geram interesse. Histórias de pessoas esforçadas que não chegaram lá não nos interessam. Um site de notícias tem essa informação na ponta do lápis: basta ver onde tem mais cliques.
Não que medição de cliques fosse muito necessária, afinal o Brasil, esse país apaixonado e patriota passou boas décadas torcendo e se rejubilando pelo nosso herói nacional Airton Senna do Brasiiiiiiiiillll, mas está cagando pelo Rubinho Barrichelo.
O Barrichelo está ali no top 20 dos melhores pilotos de Formula 1 do mundo. Mundo. Planeta Terra. Terceira bolinha a partir do sol, a única com água líquida, grama e neuroses. Aqui, com mais de 8 bilhões de pessoas, ele é melhor do que 8.024.999.980 pessoas. Mas, no extinto Casseta e Planeta ele era o Rubinho Pé de Chinelo. E todas as piadas que envolviam chegar atrasado, demorar, etc, algum comediante com uma peruca loira aparecia de macacão de F1.
Aliás, a única pessoa que encontrei com uma tatuagem é… ele mesmo:
Assim, entre milhares de histórias de vencedores e sem acesso às milhões de histórias de pessoas que se esforçaram mas não chegaram “lá”, ou às milhões de histórias das pessoas que nem se esforçaram tanto assim, ou às histórias de pessoas que desviaram a rota e escolheram outro “lá” ou que decidiram que “lá” não era tudo isso, a gente cresce achando que o mundo é assim: esforço = glórias.
Nem é.
Mas a gente se ilude dizendo já não há mais coração, e surpreendentemente, se descobre na vida adulta percebendo que não é O ELEITO afinal de contas.
Trabalho há quase 2 décadas envolvido em projetos artísticos variados e tenho visto diversos tipos de sucesso rolando: prêmios, dinheiro, louvor dos colegas, abarrotadas redes sociais, shows cheios, shows fora do Brasil, apadrinhamento por outros artistas… tudo isso são medidas de sucesso possíveis e podem ocorrer ou não. Costuma não acontecer tudo ao mesmo tempo.
Gastei um tempo olhando para esses fatores pensando como isso acontece? Como o sucesso acontece? O que faz a arte andar para a frente?
Não cheguei a conclusão alguma. Não cheguei nem à conclusão de o que seria sucesso.
O que pode significar que não há conclusão a ser tirada e que não há formula. Não há experimento a ser replicado, não há caminho que possa ser seguido. E que, portanto um dos fatores que mais pesam aqui é a estúpida e incoerente sorte. Às vezes a pessoa dá sorte e pumba, tá lá na Globo e ganhando milhões.
E outras vezes…
Aí é foda, né? Como a gente pensa o que vai fazer para o resto da vida se a perspectiva é essa maravilha aí?
Tá lôco, sô!
O sucesso é um fator fora do controle de qualquer um. E em uma conclusão muito zen / Star Wars, a única coisa que eu posso pensar é em controlar o meu caminho. Aliás, não é nem o caminho. O caminho também depende de sorte. Vai saber quais as curvas que estão vindo aí? As pedras? O único fator de controle aqui é o jeito de caminhar. Nem a direção!
E pronto, resolvido, acabado, bora pra frente? Não. Nem escolher a coreografia é fácil.
Muito se fala em cursos e workshop de escrita em “encontrar sua voz”, seu jeito, seu estilo. Rapaz, se fosse fácil, olha… Vou nem entrar nesse assunto que isso é diálogo de doido. Ciranda de maluco. Dança de cossaco.
Cada dia tem uma decisão nova para ser tomada na minha coreografia. A de hoje é: escrevo o que querem de mim ou quero eu do mundo?
Essas duas opções, é claro, não são duas. São dois gigantes leques de possibilidades e, se pá, não são sequer excludentes. E, como vimos arriba deste texto, não tem escolher certo ou escolher errado. Ou deve ter, a gente só não tem como saber o que é certo e o que é errado.
Mas, vamos falar em termos concretos que é para eu não escrever 10.000 palavras em cada substack e não chegar a lugar algum: participo de dois ou três grupos de escritores que conversam sobre tudo isso aí que está nos parágrafos supra relacionados. E esses grupos são bons de identificar revistas que compram textos literários.
Por revistas, é claro, entenda-se site. Ninguém mais imprime um volume de papel para ser diagramado e impresso e enviado pelo correio. Bota lá no site, manda no e-mail da galera e pronto. A parte mágica da história é que essas revistas pagam para o escritor! Sim, em dinheiro! E não é nem uma paçoca e uma caçulinha. É dinheiro de verdade porque são revistas gringas. E o dólar tá ultrapassando R$ 6,00, portanto os US$ 300 que eles pagam lá para escritor em português tá dando… Sei lá, o preço de um apartamento?
(Na verdade eles pagam por palavra escrita, então se eu enrolar bastante, fazer longas descrições dá para vender uma história por até R$ 9 mil!)
Não vai acontecer de eu vender uma história por mês, não vai acontecer de eu viver disso, não vai acontecer de o dólar continuar nessas alturas, etc, etc, etc.
É um passo, não é o caminho.
Mas, eles tem lá o estilão próprio delas, apesar de haver milhares de revistas comprando textos (a valores variados). E aí, escrevo eu dentro da carinha que essas revistas tem para aumentar minhas chances de vender um texto? Eles têm exigências, é lógico? Ou escrevo o que eu quero do jeito que eu quero e vejo se alguém tem algum mínimo interesse no que eu sei fazer?
Caso eu pense mais em me adequar ao “mercado”, é só ir lá trabalhar. Caso eu queira ser fiel ao que eu quero e ignorar todo mundo, eu corro o risco de ser o tal artista a frente do meu tempo, que só serei respeitado depois de morto.
Mas aí fica a pergunta: o que diabos quero eu?
Bêjo!
A propósito de coisa nenhuma, estou fazendo uma discreta tatuagem. Já foram 3 sessões, hoje é a última! Semana que vem mostro o resultado total.
Li essa semana o diário de Carolina Maria de Jesus. Que pedrada! Um relato de uma favelada nos anos 60 sustentando seus três filhos catando papel na rua. E em 80 anos, nesse quesito, o Brasil não evoluiu NADA! É de doer o coração.
Se você estiver com saudade da voz de Amy Winehouse, ouça essa aqui. Gin Wigmore é neozelandesa e tem o mesmo estilão de cantar. Mas ela é bem mais rock e menos Motown. Estou achando incrível.
Castanha do Pará é o gibi do Gidalti Jr de 2016, mas seu só me cocei para comprar agora. Vencedor do Jabuti conta a história de um jovem da periferia de Belém chamado Castanha, que tem corpo de gente e rosto de urubu e vive entre as barracas do Mercado Ver-o-Peso. É genial, épico, empolgante e MUITO lindo!